Dançando no escuro
“Trabalhe como se não precisasse de dinheiro. Ame como se nunca tivesse sido magoado. Dance como se ninguém estivesse vendo.” – Satchel Paige
Todas as noites, um monte de objetos celestes – pequenos e grandes – dançam ao som da silenciosa melodia da gravidade. Na escuridão do espaço além de Netuno, um grupo de objetos do Cinturão de Kuiper (Kuiper Belt Objects, KBOs) dançam como se ninguém estivesse vendo – até agora.
Eles dançam lentamente, pois os objetos do Cinturão de Kuiper levam séculos para completar uma órbita. Esses KBOs, cada um com tamanho da ordem de centenas de quilômetros, foram descobertos pelo DES ao longo dos últimos dois anos e meio (um deles foi descrito nesse blog num post anterior). Vamos supor que você desconheça a existência da gravidade. O que você deduziria de um padrão como o apresentado no video? Como explicar isso? As leis que regem essas complicadas danças celestiais devem ser muito complicadas, certo?
Os povos antigos demarcavam o passeio dos planetas no céu de noite em noite e de estação em estação do ano. Eles perceberam que os planetas se moviam de uma maneira diferente: algumas vezes eles pareciam parar, virar, e se mover na direção contrária da abóboda celeste, até virarem novamente e seguirem seu rumo. Modelos engenhosos foram criados para explicar essa dança complicada. Mas eles se tornavam cada vez mais complicados, e pior, não conseguiam descrever observações mais modernas e precisas.
Duas revoluções científicas – primeiro com Copérnico e depois com Newton – foram necessárias para mostrar que o movimento planetário podia ser explicado por uma simples equação, a lei da gravitação. De repente o padrão obscuro ficou claro.
A pirueta graciosa executada pelos KBOs é produzida pela combinação de dois movimentos. A órbita centenária produz um lento deslocamento para leste que o leva ao longo de um campo da DECam por ano. Mas nós observamos esses objetos a partir de uma plataforma em movimento, o planeta Terra. A medida que a Terra segue em sua jornada em volta do Sol, observamos o KBO de diferentes perspectivas, algumas vezes a 150 milhões de quilômetros de distância de um lado do Sol, seis meses mais tarde, à mesma distância do outro lado do Sol, e em outras épocas de algum lugar entre estes dois extremos. O movimento resultante é um vai-e-vem relativo às estrelas distantes que servem como pano de fundo para a órbita do KBO. Para ter uma idéia melhor, enquanto gira sua cabeça de um lado para o outro, observe como a ponta do seu dedo se move em relação à objetos no fundo do seu campo de visão.
Um objetivo da Física é extrair ordem da complexidade, explicar uma grande variedade de fenômenos com um pequeno conjunto de leis simples. Com o tempo, físicos perceberam que a lei da gravitação de Newton falhava em algumas situações e precisava ser substituída pela Teoria da Relatividade Geral de Einstein.
Hoje em dia, a gravidade confronta nossa geração com um novo quebra-cabeça de grandes proporções: Por que a expansão do universo está acelerada ? Talvez alguma nova lei irá explicar o mistério da energia escura e a dança dos planetas com a mesma elegância e simplicidade. Essa é a esperança que mantém nossos detetives da energia escura olhando pacientemente para cima.
Det. Dave Gerdes [Universidade de Michigan]
Tradução: Det. Ricardo Ogando e Det. Flávia Sobreira
What do you think about the darkness?